Os seis clubes paulistas afetados pela determinação conjunta de Ministério Público (MP-SP) e Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP), que vigora desde 2016, são a favor do fim da torcida única nos jogos entre si. Corinthians, Guarani, Palmeiras, Ponte Preta, Santos e São Paulo entendem que a medida não faz sentido, levantou a ESPN. 63641o
No entanto, apesar de as equipes falarem a mesma língua sobre o tema, ainda existe um ime com o próprio MP e com o Juizado Especial Criminal (JECRIM).
Na última semana, a ESPN antecipou o projeto conjunto que Palmeiras e São Paulo criaram, com cada um cedendo seu estádio para o rival quando suas casas estiverem ocupadas com outros eventos, caso de shows musicais, por exemplo, como forma de um pontapé inicial para acabar com a torcida única em seus duelos.
Com o Allianz Parque ocupado, o clube alviverde levou o clássico contra o Santos, no último sábado (4), para o Morumbi. Sem qualquer dano significativo ao patrimônio tricolor registrado após vistoria, as duas agremiações usaram a realização da partida como trunfo para o retorno de duas torcidas nos duelos entre si e contra as outras quatro já citadas. E o fizeram por meio de nota oficial conjunta divulgada na última segunda-feira (6).
Mas o que ainda falta para que a torcida única chegue ao fim em São Paulo?
A ESPN foi atrás dos clubes envolvidos, da Federação Paulista de Futebol (FPF), da Polícia Militar (PM) e da SSP para saber o que cada instituição alega, seja a favor ou contra a manutenção da medida. Também foram ouvidos representantes das principais torcidas organizadas do estado.
Quem é contra? 6g6z44
Mesmo com o lobby dos clubes, o Ministério Público paulista segue contrário ao fim da torcida única. E o principal motivo alegado é a segurança. Veja abaixo o posicionamento oficial.
"O Comitê que envolve o MP-SP, as polícias Civil e Militar e o poder Judiciário ainda acredita na importância da torcida única como meio de prevenção de grandes confrontos e violência generalizada".
Posição semelhante tem o JECRIM de São Paulo. O promotor do órgão que é responsável por torcidas, doutor Roberto Bacal, falou com a reportagem. Veja o que ele respondeu abaixo.
"Nós temos um comitê que reúne Polícia Civil, Polícia Militar, Ministério Público e Poder Judiciário de São Paulo e somos contra a volta de duas torcidas. Pelo menos por ora. É importante manter a torcida única para evitar possíveis conflitos".
Questionado sobre a alegação dos clubes de que as torcidas não representam perigo no estádio em dias de jogo, ele afirmou:
"Nos estádios, não preocupa tanto. Mas o problema é que, em dia de clássico, aumenta o fluxo de torcedores na cidade, em entroncamento de trens, estações de metrô. Aumenta o fluxo. Pode haver conflitos".
Quem é neutro? 302r2w
Questionada sobre a possibilidade do fim da torcida única, a Federação Paulista de Futebol acredita que ainda é necessário, além de um rigor maior da legislação contra a impunidade dos vândalos, um diálogo entre os envolvidos para que se chegue a soluções exemplares e definitivas do caso.
Para a entidade, mesmo com a redução dos confrontos a partir da proibição de torcidas rivais no mesmo estádio, a torcida única não pode ser considerada a única solução para o fim da violência no futebol. Veja abaixo a nota oficial da FPF.
"A adoção de torcida única nos estádios paulistas é uma determinação do Ministério Público Estadual e da Secretaria de Segurança Pública adotada desde 2016. Embora estatísticas indiquem que confrontos entre torcidas tenham reduzido e público e renda dos jogos tenham aumentado, a Federação Paulista de Futebol não enxerga na aplicação de torcida única a solução para o problema da violência no Futebol", explicou.
"A FPF prega maior rigor na aplicação da legislação vigente para pôr fim à impunidade que ronda os casos de violência no futebol. Reforçamos ainda a necessidade de aumentar o diálogo com o poder público, clubes e sociedade civil para elaborarmos soluções exemplares e definitivas para este problema".
Quem tem posição semelhante é Guilherme Derrite, secretário de segurança pública do estado de São Paulo, que trata a questão com cuidado extra. Além do temor de que os confrontos se tornem constante, Derrite alerta para as diferenças entre os estádios.
"A secretaria vê com muita cautela a possibilidade da retomada de duas torcidas, haja vista as tragédias que aconteceram dentro dos estádios, nas áreas imediatas e por vezes longe do local da partida, como estações de trem, de metrô e até áreas de terminais de ônibus", afirmou.
"Em virtude disso, existe uma preocupação muito grande da nossa parte, porque desde a recomendação dada pelo Ministério Público estadual, não tivemos mais aquelas cenas lamentáveis de agressões, confrontos e até mesmo eventuais mortes que já ocorreram", continuou o secretario.
"Temos que pontuar que nem todos os estádios estão preparados para que haja uma divisão eficaz das torcidas. Caso isso avance, alguns estádios precisam se adaptar para garantir a segurança daqueles que são maioria, que vão aos estádios para curtir os jogos. Mas existe uma preocupação da nossa parte para evitar novas tragédias".

Quem é a favor? m968
Corinthians, Guarani, Ponte Preta e Santos foram diretos nas respostas à reportagem: assim como Palmeiras e São Paulo, defendem o fim da torcida única, logo, querem a volta do público nos clássicos e nos confrontos entre si. Veja abaixo o posicionamento de cada um.
"O Corinthians sempre foi contra a torcida única nos clássicos e apoia a volta dos grandes jogos com a presença do visitante. O clube confia na capacidade do poder público de garantir a segurança dentro e fora dos estádios e torce para que rapidamente os clássicos possam ser realizados com duas torcidas".
"O Guarani Futebol Clube é favorável à volta de duas torcidas em clássicos. Tendo em vista como prioridade a segurança de todos e consequentemente valorizando o espetáculo, o Guarani Futebol Clube vê de maneira positiva a volta de duas torcidas em grandes clássicos no estado de São Paulo".
Palmeiras e São Paulo emitiram nota conjunta.
"As diretorias de São Paulo Futebol Clube e Sociedade Esportiva Palmeiras vêm conjuntamente a público celebrar o sucesso da operação que viabilizou a realização do clássico de sábado (4) no Estádio do Morumbi. Após vistoria extensiva, acompanhada por representantes técnicos dos dois clubes, em toda a área de circulação de público e estafe do Cícero Pompeu de Toledo, não foram constatados danos significativos nas dependências do estádio. Na avaliação das presidências de ambas as agremiações, o saldo positivo do evento contribui para que, futuramente, os clássicos estaduais voltem a ser disputados com a presença de duas torcidas".
"A Ponte Preta acha essa possibilidade maravilhosa. No entender do clube, a presença da torcida é a essência do futebol. É o que faz o futebol ficar bonito, o que faz ter a festa na arquibancada. A Ponte Preta é totalmente favorável a essa ideia e considera que seria importantíssima a presença de todas as torcidas".
O Santos não emitiu nota oficial, mas respondeu à ESPN assim, por meio de sua assessoria: "O presidente Andres Rueda informou nesta terça-feira (7) que também é favorável ao retorno das duas torcidas em clássicos".

O que dizem as organizadas? 5i1q5a
A ESPN ouviu representantes das principais organizadas de São Paulo. Todos se mostraram favoráveis à retomada das duas torcidas em clássicos e jogos importantes entre os principais clubes.
"Isso é muito importante para o futebol brasileiro, para a festa dos estádios, assim como foi a volta das bandeiras de mastro, quando as autoridades competentes deram esse voto de confiança. Como torcida organizada, pedimos mais essa confiança para a volta das duas torcidas. Cabe a nós, dirigentes das torcidas, conscientizar nosso povo de que futebol é rivalidade apenas dentro de campo", afirmou Amilton Alves Brito, o Padinho, presidente da Gaviões da Fiel.
"Se temos jogos e várias torcidas se dirigindo aos estádios e podendo ter um encontro, por que não pode ter jogos com duas torcidas onde o policiamento é mais rigoroso? Pode fazer um monitoramento muito maior nos clássicos do que em outros jogos. Então a Mancha Verde é a favor da volta das duas torcidas e deixa essa reflexão. Se está tendo duas ou três torcidas pela cidade indo para o seu jogo, por que não duas torcidas indo para um estádio só? Fica essa pergunta", completou Jorge Luis, presidente da Mancha Verde.
Até a publicação da reportagem, nenhum responsável pela Torcida Independente, do São Paulo, respondeu às perguntas da reportagem. Assim que houver um posicionamento, a matéria será atualizada.
Por que torcida única? a3r6
A determinação de torcida única em jogos envolvendo os quatro grandes clubes do estado de São Paulo começou como reflexo de um incidente em 3 de abril de 2016, um domingo com clássico entre Corinthians e Palmeiras. Antes da partida, houve confronto entre Mancha Verde e Gaviões da Fiel, que levou mais de 50 torcedores à prisão e deixou um morto.
No dia seguinte, o Ministério Público solicitou à Federação Paulista que adotasse a regra de torcidas únicas em clássicos. Horas depois, o então secretário de Segurança Pública do Estado, Alexandre de Moraes, anunciou a mudança nas regras. A ideia era que a iniciativa durasse até dezembro do mesmo ano, mas a situação se prolonga até hoje.
Os times de Campinas entraram na história anos depois. Em 2017, torcedores da Ponte Preta invadiram o gramado do Moisés Lucarelli e protagonizaram cenas assustadoras no jogo contra o Vitória, que culminou com o rebaixamento da equipe no Campeonato Brasileiro. Dessa forma, a ordem de torcida única se estendeu às partidas da Macaca.
Por consequência, o Guarani também foi incluído no bolo a partir de 2018, quando voltou a disputar o dérbi da cidade com a Ponte, na Série B do Brasileiro, e desde então nos jogos contra os grandes do estado no Paulistão.
Não que isso tenha levado à zero as brigas entre torcidas ou incidentes violentos. Em 2017, um palmeirense foi esfaqueado por dois corintianos depois de um clássico entre os dois clubes. Anos depois, na semifinal da Copa São Paulo de Futebol Júnior em 2021, um torcedor são-paulino invadiu o gramado em partida contra o Palmeiras com uma faca e ameaçou os jogadores rivais, que venceram a partida.